Em uma cirurgia inédita, um paciente de 57 anos com doença cardíaca terminal recebeu em um transplante bem-sucedido, um coração de porco geneticamente modificado. Era a única opção disponível para o paciente, que tinha uma doença cardíaca terminal. A cirurgia histórica foi realizada pelo corpo docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland (UMSOM), nos Estados Unidos.
Este transplante demonstrou pela primeira vez que um coração de animal geneticamente modificado pode funcionar como um coração humano sem ser rejeitado imediantamente pelo corpo do transplantado. O paciente, David Bennett, morador de Maryland, será cuidadosamente monitorado nas próximas semanas para determinar se o transplante oferece benefícios. Ele havia sido considerado inelegível para um transplante de coração convencional.
“Era morrer ou fazer esse transplante. Eu quero viver. Eu sei que é um tiro no escuro, mas é minha última escolha”, disse Bennett um dia antes da cirurgia. Ele estava hospitalizado e acamado nos últimos meses. “ Estou ansioso para sair da cama depois que me recuperar.”
A FDA (Food and Drug Administration), agência americana similar a Anvisa no Brasil, concedeu autorização de emergência para a cirurgia como uso compassivo, que é usado quando um produto médico experimental, neste caso o coração de porco geneticamente modificado, é a única opção disponível para um paciente que enfrenta uma condição médica grave ou com risco de morte. A autorização para prosseguir foi concedida na esperança de salvar a vida do paciente.
“Esta foi uma cirurgia inovadora e nos deixa um passo mais perto de resolver a crise de escassez de órgãos. Simplesmente não há corações humanos de doadores suficientes disponíveis para atender a longa lista de potenciais receptores. Estamos procedendo com cautela, mas também estamos otimistas de que esta cirurgia inédita no mundo fornecerá uma nova opção importante para os pacientes no futuro”, disse o Dr. Bartley P. Griffith, um dos responsáveis pelo transplante.
Cerca de 110.000 americanos estão atualmente esperando por um transplante de órgão, e mais de 6.000 pacientes morrem a cada ano antes de conseguir um, de acordo com informações do governo federal . A fila de transplante no Brasil, atualmente, tem mais de 50 mil pessoas (53.218) em busca de um órgão ou tecido.
O xenotransplante (uso de órgãos de animais em humanos) poderia salvar milhares de vidas, mas traz um conjunto único de riscos, incluindo a possibilidade de desencadear uma resposta imune perigosa. Essas respostas podem desencadear uma rejeição imediata do órgão com um resultado potencialmente mortal para o paciente.
Os xenotransplantes foram tentados pela primeira vez na década de 1980, mas foram amplamente abandonados após o famoso caso de Stephanie Fae Beauclair (conhecida como Baby Fae) na Universidade Loma Linda, na Califórnia. A criança, nascida com um problema cardíaco fatal, recebeu um transplante de coração de babuíno e morreu um mês após o procedimento devido à rejeição do sistema imunológico ao coração estranho. No entanto, por muitos anos, válvulas cardíacas de porco têm sido usadas com sucesso para substituir válvulas em humanos.
Antes de consentir em receber o transplante, Sr. Bennett, o paciente, foi totalmente informado sobre os riscos envolvidos, e que o procedimento era experimental com riscos e benefícios desconhecidos. Ele havia sido internado no hospital mais de seis semanas antes com arritmia. Como havia risco de morrer, o paciente foi conectado a uma máquina chamada “pulmão-coração artificial”, a qual passa então a exercer provisoriamente as funções daqueles órgãos. Além de não se qualificar para estar na lista de transplantes, ele também foi considerado inelegível para uma bomba cardíaca artificial devido à sua arritmia.
Os médicos também usaram uma nova droga junto com as drogas anti-rejeição convencionais, que são projetadas para suprimir o sistema imunológico e impedir que o corpo rejeite o órgão estranho. O novo medicamento utilizado é um composto experimental fabricado pela Kiniksa Pharmaceuticals.
“Este procedimento histórico e sem precedentes destaca a importância da pesquisa translacional que estabelece as bases para os pacientes se beneficiarem no futuro. É o culminar de nosso compromisso de longa data com a descoberta e inovação em nosso programa de xenotransplante”, disse o Dr. E. Albert Reece, vice-presidente executivo de assuntos médicos da UM Baltimore .
Órgãos de porcos geneticamente modificados têm sido o foco de grande parte da pesquisa em xenotransplante, em parte por causa das semelhanças fisiológicas entre porcos, humanos e primatas não humanos. Três genes – responsáveis pela rápida rejeição mediada por anticorpos de órgãos de porco por humanos – foram “adormecidos” no porco doador. Outros seis genes humanos responsáveis pela aceitação imunológica do coração de porco foram inseridos no genoma do suíno. Por fim, um gene adicional no porco foi eliminado para evitar o crescimento excessivo do tecido cardíaco do porco, que totalizou 10 edições genéticas únicas feitas no porco doador.
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